Em
crise, universidades federais dizem só ter condição de funcionar
até setembro
Para tentar minimizar os efeitos do contingenciamento de verbas da União, instituições de ensino estão renegociando contratos com fornecedores
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Divulgação/UFRGS
Dimensões da crise: reitoria da UFRGS estima deficit de R$ 40
milhões até o fim deste ano |
O cenário de crise financeira que atinge o País também afetado
o funcionamento das universidades federais. Com a redução nos
recursos enviados pela União, as instituições têm de apelar para
medidas como renegociação de contratos, redução nos cardápios em
restaurantes universitários. Mesmo assim, entretanto, falta verba
para manutenção e para o pagamento de contas.
Os efeitos da crise são tão graves que, de acordo com o
presidente da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das
Instituições Federais de Ensino Superior), Emmanuel Tourinho, os
valores de custeio previstos para este ano para as universidades não
são suficientes nem mesmo para as despesas regulares com energia,
vigilância, limpeza, bolsas para os alunos de baixa renda e serviços
de manutenção das instalações.
Tourinho afirma que não há recursos nem para concluir as obras
já iniciadas. Nas universidades mais antigas, há problemas de
infraestrutura por causa da falta de manutenção. Já as
instituições novas estão funcionando em prédios alugados. Isso
porque não têm verba para finalizar os serviços nas instalações
próprias.
“Não será possível manter as instituições funcionando
adequadamente se esse quadro não for rapidamente alterado. Os
valores liberados até agora só garantem o funcionamento das
instituições até setembro”, diz o presidente da Andifes.
Tourinho, que além de presidir a associação também é reitor
da UFPA (Universidade Federal do Pará), afirma que é
“imprescindível” a recomposição imediata dos orçamentos das
universidades federais. “Estamos falando de um patrimônio dos mais
valiosos para a sociedade brasileira e que está sendo colocado em
risco. O prejuízo no longo prazo será incalculável”, alerta.
Para tentar amenizar os problemas, o MEC (Ministério da Educação)
anunciou na semana passada um aumento em cinco pontos percentuais no
limite de empenho para custeio e investimento de universidades e
institutos federais. A medida fez com que o limite de custeio –
utilizado para a manutenção das instituições de ensino –
passasse de 70% de 75%. O limite de capital, usado para a aquisição
de equipamentos e para a realização de investimentos, foi elevado
de 40% para 45%.
O presidente da associação adverte que, mesmo com a liberação,
a situação das instituição não muda em relação à capacidade
de honrar com os compromissos financeiros até o mês de setembro.
“Para 2018, o quadro é também preocupante. Não temos ainda a
previsão de recursos para investimento, nem a correção dos
recursos de custeio”, diz Tourinho.
UnB
A UnB (Universidade de Brasília) estima que, neste ano, o deficit
orçamentário será de R$ 105,6 milhões. Segundo Denise Imbroisi,
decana de Planejamento e Orçamento da instituição, a universidade
tem recursos para operar somente até o mês que vem e conta com uma
suplementação de crédito do governo para se manter até o fim do
ano.
Denise afirma que o objetivo da UnB é manter o funcionamento de
maneira adequada. “Temos recursos orçamentários para sobreviver
até o fim de agosto, início de setembro”, acrescenta.
A universidade vem renegociando contratos desde o ano passado com
prestadores de serviços para tentar viabilizar a redução nas
despesas. No restaurante universitário, uma revisão contratual
possibilitou a queda de 15% no valor gasto. A diminuição foi
possível por causa do corte de alguns itens do café da manhã, como
suco, iogurte e chá. No almoço, foi feita uma adequação da
proteína oferecida. Para isso, foram incluídas carnes como costela,
rabo de boi, linguiça e hambúrguer nos cardápios.
A direção da universidade solicitou ao MEC que elevasse o teto
de receita própria que pode ser arrecadada por meio de aluguéis ou
projetos de professores. A UnB também pediu ao ministério que
autorize a utilização do superavit de anos anteriores – os
valores foram para o Tesouro.
UFRGS
A UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) projeta que,
até o fim do ano, o deficit será de R$ 40 milhões. O reitor da
instituição, Rui Vicente Oppermann, afirma que a prioridade da
administração é conseguir arcar com o pagamento dos terceirizados.
“Hoje temos uma tomada de decisão que é quase aquela de Sofia –
onde é que vou fazer cortes? Nos últimos anos temos feito
racionalização de serviços para diminuir a despesa com
terceirizados, mas já chegamos a um limite”, afirma.
Sem recursos, a universidade está deixando de lado neste momento
despesas compulsórias, como contas de luz, água e referentes à
comunicação. “Contamos com a compreensão dos prestadores desses
serviços públicos para que possamos fazer a rolagem dessa dívida
sem maiores consequências.” Na lista de corte, o item seguinte são
os serviços relacionados aos serviços de reformas e manutenção,
que são fundamentais já que se trata de um campus extenso e com
prédios antigos.
Oppermann diz esperar que não exista necessidade de redução em
serviços como segurança, limpeza e fornecimento de alimentos.
“Estamos confiando em um mínimo de sensibilidade do governo na
liberação de recursos para que a gente possa chegar com pelo menos
90% do custeio liberado até o fim do ano”, admite.
UFRJ
A situação orçamentária é considerada crítica pela direção
da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Para este ano, o
orçamento é 6,7% menor do que no ano passado. O reitor da UFRJ,
Roberto Leher, destaca que, no ano passado, muitas contas foram pagas
somente até o mês de setembro, o que deslocou para o orçamento de
2017 o pagamento das despesas não pagas.
Nos últimos três anos, o quadro de pessoal terceirizado foi
reduzido pela metade, e contratos com permissionários foram
revisados. A universidade lançou uma campanha com a meta de reduzir
em 25% as despesas com energia elétrica.
A UFRJ diz que, desde 2014, a falta de recursos afeta gravemente o
funcionamento da universidade. “Nos últimos anos, a UFRJ vem
sofrendo cortes crescentes, significativos e rigorosos, em seu
orçamento, os quais comprometem sua capacidade de funcionamento e
suas possibilidades de oferecer o melhor acolhimento aos alunos que
chegam à universidade pelas novas vagas geradas no processo de
expansão e pelas cotas criadas para democratizar o acesso e a
garantia das ações afirmativas”, diz a universidade, em nota.
UFMG
Segundo Jaime Ramírez, reitor da UFMG (Universidade Federal de
Minas Gerais), a universidade só tem recurso para as despesas
cotidianas, como insumos e mão de obra terceirizada, até o mês que
vem. Ele afirma que, se o governo federal mantiver a liberação de
recursos no patamar de 85% do previsto, a UFMG e “todas as outras
federais” vão enfrentar uma situação financeira grave até o fim
do ano.
Mesmo diante da gravidade do quadro, Ramírez garante que a
universidade não irá suspender as atividades, ainda que, para isso,
seja necessário atrasar o pagamento de fornecedores. Ele assegura
que não haverá redução no pagamento de bolsas e benefícios de
assistência estudantil, pois recursos de custeio têm sido
utilizados para complementar o pagamento dos benefícios.
A UFMG informa que sua administração está trabalhando para que
o governo federal libere R$ 25,98 milhões de recursos de custeio, o
que corresponde a 15% do orçamento da universidade para 2017. O
orçamento de custeio da UFMG em 2017 é de R$ 173,2 milhões, cerca
de 10% inferior ao de 2016.
Outro lado
O ministro da Educação, Mendonça Filho, afirma que a meta da
pasta é liberar 100% dos valores para custeio até o fim do ano.
“Estamos no meio do exercício, e as liberações ocorrerão
gradualmente, ao longo dos próximos meses, até dezembro. Então,
posso tranquilizar as universidades federais de que os recursos serão
liberados”, disse. De acordo com o MEC, neste ano já foram
liberados R$ 4,8 bilhões para limite de empenho das universidades
federais.
O limite de empenho previsto inicialmente para as universidades
federais para este ano é 85% do valor previsto para despesas de
custeio e de 60% para despesas de capital. “No entanto, o MEC está
trabalhando para aumentar esse limite, assim como fez no ano passado,
quando, mesmo após o contingenciamento feito pelo governo anterior,
conseguiu liberar 100% de custeio para as universidades”, diz o
ministério.
Mendonça Filho acrescenta que, além da crise, os problemas
financeiros enfrentados pelas universidades muitas vezes decorrem de
má gestão. “Em muitas situações de universidades federais há
divergência e desequilíbrio do ponto de vista de capacidade
gerencial. Algumas universidades não enfrentam problemas e
dificuldades, porque elas são competentes, capazes e qualificam
melhor suas gestões”, disse, lembrando que não compete ao MEC
liberar a administração de recursos nas universidades federais.
* Com informações da Agência Brasil