EUA estudam aliados naturais contra o próximo grande furacão
A enchente provocada pelo furacão Sandy mal havia deixado Nova York no ano passado quando começaram a surgir sugestões de maneiras para manter seguras a cidade e outras áreas baixas em tempestades futuras.
Muros contra enchentes mais altos e anteparas se faziam necessárias, para alguns especialistas. Outros pediam projetos de engenharia ainda maiores, como barreiras para marés de tempestades, com o intuito de manter a água a distância.
Contudo, as sugestões mais intrigantes envolviam abordagens naturais. Para alguns, por que não deveríamos devolver Nova York a seus dias de glórias como capital da ostra e construir recifes no porto que pudessem ajudar a vencer as ondas das tempestades? Por que não transformar Lower Manhattan em uma Xangrilá aquática, adornando-a com pântanos que pudessem reduzir a água da tempestade?
'Muita gente quer que a solução venha de brejos, não de muros', disse Philip Orton, pesquisador que estuda a maré de tempestades no Instituto Stevens de Tecnologia, em Hoboken, Nova Jersey. 'É uma coisa cordial e confusa.' Entretanto, na melhor das hipóteses, os recursos naturais são uma solução incerta. Enquanto algumas barreiras naturais, como as dunas, se mostraram muito eficazes na absorção de boa parte da energia de uma tempestade – durante o furacão Sandy, as cidades praianas com dunas sofreram menos prejuízos em geral do que as sem – não está muito claro se pântanos, recifes para ostras, florestas de algas ou similares oferecem muita proteção.
As interações entre a tempestade e recursos naturais são complexas e as dinâmicas de cada tempestade são diferentes, explicam os cientistas, dificultando a quantificação da proteção.
'Tem muita gente falando que os brejos podem reduzir a maré da tempestade', disse Rusty Feagin, ecologista da Universidade Texas A&M. 'Não existe muita prova empírica disso.'
Os defensores de uma abordagem natural afirmam que, segundo sua pesquisa, os mangues e recifes podem oferecer alguma proteção, principalmente contra as ondas. De acordo com eles, soluções de engenharia como os quebra-mares também têm seus problemas, por exemplo, eles podem piorar a inundação e a erosão em outros lugares. Já os pântanos e os bancos de ostras oferecem outros benefícios aos ecossistemas. Por exemplo, os brejos podem aguentar os níveis crescentes do mar trazidos pela mudança climática porque à medida que a grama do charco reduz a água, o sedimento trazido pela água se deposita, elevando o solo. E as ostras filtram impurezas, melhorando a qualidade da água.
Entretanto, mesmo os maiores proponentes das defesas naturais reconhecem que elas não são páreo para uma tempestade como a Sandy, que produziu uma maré de tempestade recorde de mais de quatro metros no porto de Nova York.
'Todas essas coisas têm limitações, mas podem oferecer alguma redução de risco', afirmou Nicole P. Maher, cientista especializada em litoral da Nature Conservancy, Long Island, que estuda a baía Jamaica, no Queens, e outros mangues. 'Porém, quando se tem água funda de verdade, não importa se é estacionamento, banco de ostras ou pântano salgado.'
No ano que se passou desde o Sandy, o pensamento a respeito do uso de defesas naturais evoluiu. Na segunda-feira, véspera do primeiro aniversário da tempestade, dez grupos de projetistas mostraram suas ideias em Manhattan como parte de uma competição patrocinada pela Rebuild by Design para tornar a região mais resistente frente às tempestades futuras e à mudança climática.
Embora tenha se falado bastante sobre a necessidade de pântanos salgados e bancos de ostras, muitos dos grupos optaram por uma abordagem híbrida – combinando vegetação a bermas projetadas, por exemplo, ou recifes de ostras com grandes estruturas submersas instaladas com a intenção de reduzir a energia das ondas.
'As defesas naturais são uma espécie de chamariz – todo mundo gosta delas', disse Edgar J. Westerhof, urbanista que trabalha com um dos grupos da competição, WXY/West8. 'No fim das contas, no entanto, não é a solução completa.'
Se um pântano ou recife é eficiente na redução da maré da tempestade é porque dissipa a energia enquanto a água passa sobre a grama, raízes, conchas das ostras e outros materiais, gerando fricção. Contudo, a fricção só funciona até certo ponto, disse Joannes J. Westerink, engenheiro-civil da Universidade de Notre Dame que desenvolveu um software de modelagem que é utilizado para simular marés e outros efeitos das tempestades. 'Se a estrutura da tempestade se apresenta de tal forma que a água tenha tempo de entrar, então a resistência ao atrito vai reduzi-la, mas não vai impedi-la de chegar até lá.'
Westerink descobriu que as tempestades que se movem lentamente são menos afetadas pelos pântanos do que as velozes. Ele rodou simulações de furacões lentos do passado – por exemplo, o Ike, que atingiu o Golfo do México em 2008 – e constatou que as marés em algumas áreas na verdade aumentam à medida que a tempestade passa pelos brejos.
Tais resultados vão de encontro ao que há muito é considerado uma regra prática sobre charcos e tempestades, segundo a qual, a cada cinco quilômetros de pântano, a maré da tempestade é reduzida em cerca de 30 centímetros.
Tal regra foi criada pelos pesquisadores do Corpo de Engenheiros do Exército, em 1963, que examinaram somente nove tempestades, todas no Golfo do México. Embora ela ainda seja citada em alguns textos técnicos, muitos pesquisadores agora a deixam de lado e veem o impacto dos mangues como altamente variável. Outro fator positivo é se existirem dezenas de quilômetros deles, como se dá em Nova Orleans e em outras partes do Golfo do México.
'Certamente é maravilhoso pensar que os brejos são barreiras', afirmou Orton, do Instituto Stevens. 'todavia, isso somente é verdade se existir muito espaço.'
Faixas estreitas de mangue, como foram propostas para algumas áreas ao redor de Lower Manhattan, quase não teriam efeito na maré da tempestade. E boa parte do resto da região de Nova York é tão desenvolvida que existem poucos trechos grandes de brejos para amortecer as tempestades. Já uma área como a baía Jamaica, que se alonga por perto de 15 quilômetros de Breezy Point, Queens, ao Aeroporto Internacional John F. Kennedy, pode oferecer alguma proteção, afirmou Orton, em especial se fosse restaurada às condições históricas, antes da dragagem dos canais de navegação. Vários grupos do fórum público pediram para deixar a baía mais rasa e a restauração dos pântanos perdidos.
Contudo, mesmo que uma faixa pantanosa estreita tivesse pouco impacto na maré da tempestade, ela poderia reduzir a energia da tempestade, disse Westerink, da Notre Dame. 'As escalas de movimento são muito menores' com ondas e mesmo que o brejo fosse tomado pela maré da tempestade, ele 'atenuaria as ondas de forma bastante eficaz'.
'E as ondas podem derrubar a base da infraestrutura.'
Os recifes de ostras poderiam ter o mesmo efeito nas ondas, principalmente nas menores em tempestades menos severas, garantiu Michael W. Beck, cientista marinho chefe da Nature Conservancy. A organização tem projetos de desenvolvimento de recifes de ostras no litoral leste e do Golfo, nos quais grandes quantidades de conchas, colocadas em água rasa, servem como abrigo para a larva da ostra se instalar.
'Esse é um problema de engenharia litorânea bastante comum', disse Beck. 'Eles estão sendo projetados por toda a Europa. Nós estamos pegando os projetos e aplicando aos recifes de ostras.'
Ao reduzir a energia da onda, os recifes auxiliam a redução da erosão nos charcos próximos ou outras áreas costeiras, tornando-os mais fortes e resistentes.
'No geral, o que se espera é que esses habitats naturais contribuam para reduzir a erosão e a inundação dos eventos pequenos e de alta frequência.'
'É importante reconhecer que todas as ações de que estamos falando são etapas na redução de riscos', explicou Beck. 'Não existe uma solução. Os habitats naturais estão colaborando para uma parte dessa redução, o que é muito importante.'
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FONTE: MSN