A fama e os infortúnios de um imitador afegão
Cabul, Afeganistão – À primeira vista, os dois não se parecem. Um deles é majestoso, com uma barba branca aparada e um gosto impecável por roupas de alfaiataria. O outro usa óculos fundo de garrafa, tem cheiro de tabaco azedo e pouco dinheiro para se preocupar com moda ou higiene pessoal.
Um é o presidente do Afeganistão, Hamid Karzai. O outro é um comediante itinerante chamado Zabiullah, cuja habilidade inigualável de imitar o líder afegão lhe deu renome em todo o país.
A maioria das pessoas o conhece simplesmente como Zabi, e gravações em áudio de suas apresentações podem ser encontradas em celulares de todo o país. Suas imitações também atraíram mais de 100.000 visitas no YouTube.
Agora, as pessoas o param na rua, oferecendo uma refeição ou um refrigerante em troca de uma imitação do presidente com as notícias do dia. Zabi, um homem magricelo de 28 anos que tem apenas um nome, aceita alegremente, desde que não haja nenhum policial ou agente da inteligência nos arredores. Ele tem boas razões para ser cauteloso: suas imitações custaram seu último emprego há cinco anos, como garçom que servia chá em um escritório do governo, e ele só começou a ganhar um dinheirinho com a performance depois de muitos batalha.
Além do medo de represálias oficiais, existe outro problema: Zabi pode até ser loucamente engraçado, mas muitos afegãos o consideram totalmente louco. Com sua queda por palavrões e tabus, terminando a maior parte de suas imitações arrasadoras do presidente com sua marca pessoal: "Diga para suã mãe que eu mandei lembranças!" – uma vulgaridade extremamente ofensiva, embora hilária, em um país no qual as parentes de um homem são sacrossantas.
Quando está representando, ele acusa os estrangeiros de forjarem as eleições presidenciais de 2009 ("Eu não passava de um pashtun! Mas os americanos me ensinaram a forjar as eleições!") e fala sobre o desejo de permanecer no poder depois que o mandato terminar oficialmente no ano que vem ("Os americanos me colocaram no poder! Eu estava à toa em um hotel. Por que deveria sair agora?").
Daniel Berehulak/The New York Times
'Ele faz parte da minha vida', afirmou Zabi, que adotou o jeito de andar do presidente, um andar propositalmente inclinado e afetado, com os ombros levemente elevados. Embora os dois não se pareçam nem um pouco, Zabi aprendeu a dominar os gestos e expressões faciais que são a marca registrada de Karzai.
'É claro que vou sentir falta dele', afirmou Zabi sobre o presidente. 'Sim, ele nunca me convidou para conhecê-lo, mas isso não tem importância. Ele nunca tentou machucar as pessoas'.
Depois de uma década no centro da vida pública afegã, Karzia está chegando perto do fim de seu mandato presidencial. À medida que esse dia se aproxima e as relações entre Karzai e os aliados americanos azedaram a ponto de gerar uma crise nos últimos meses, Zabi começa a se preocupar com o próprio futuro.
'No ano que vem, ninguém mais vai querer saber de imitações de Karzai', afirmou, saindo do personagem durante um raro momento de seriedade.
Embora Zabi seja popular neste momento, sua vida foi marcada por tragédias. Ele sempre foi pobre e ficou aterrorizado quando perdeu o emprego no Escritório de Relações Administrativas, ligado ao palácio presidencial. Seus superiores temiam que as imitações de Karzai pudessem causar problemas para todos no escritório, um medo que se espalhou por todos os setores e praticamente impediu que Zabi voltasse a ser contratado.
Nos últimos cinco anos, ele tentou arranjar diversos empregos, mas assim que os patrões potenciais ficavam sabendo quem ele era, temiam a atenção que ele pudesse atrair das autoridades. Ele foi obrigado a contar justamente com a imitação de Karzai que o havia deixado nessa situação.
É fácil imaginar Zabi se apresentando na TV em um país mas ocidentalizado, onde a imitação dos presidentes é vista como uma forma de arte. Porém, muito embora a sociedade afegã tolere a liberdade de expressão mais do que em muitos outros países muçulmanos, xingar as pessoas em público vai muito além dos limites do aceitável por aqui.
Zabi, que sofreu uma pequena lesão cerebral causada pela meningite quando era criança, tem dificuldades para controlar suas imitações e seu comportamento. Ele abandonou a escola no sexto ano em função das dificuldades de aprendizagem. Ele parece ter um espírito gentil e sensível, mas muitas vezes tem dificuldades para perceber que passou dos limites e, em frente das multidões, ele é instigado pelos fãs, que encorajam sua irreverência.
'Quando digo que não quero falar palavrões, eles não me dão dinheiro', afirmou, sentado em uma almofada na casa da família.
Um de seus amigos, dono de um hotel em Cabul, afirmou que Zabi pode encontrar um emprego mais permanente como imitador, se não falar tantos palavrões. Todavia, quando informado disso, Zabi simplesmente dá de ombros e diz que é livre para se expressar.
'Queremos que as pessoas se esqueçam de seus problemas. Quando ele vem e se apresenta, ele faz todo mundo rir e gostamos disso', afirmou Zabiullah Sharifi, o dono do hotel. 'Mas ele fala muitos palavrões e isso chega a incomodar as pessoas'.
Ele se tornou uma fonte constante de preocupação para a mãe, que conta com Zabi, seu filho mais velho. Ela sente medo quando ele está na rua, perguntando-se se ele foi preso ou espancado por pessoas que não gostam de suas imitações. Ele costuma caminhar sem rumo pela cidade, parando de tempos em tempos para ver amigos que pagam um dólar ou dois para ver suas apresentações.
De vez em quando ela liga para os amigos e pergunta se ele está incomodando, mas sua verdadeira intenção é saber se está tudo bem com o filho.
'Às vezes, quando ele chega tarde em casa, eu mando o irmão procurá-lo ou vou atrás dele sozinha. Ficamos muito preocupados com ele, sem saber aonde ele vai e com quem ele está, porque temos medo que alguém o machuque', afirmou a mãe, que é professora.
Sentados na casa da família, em um prédio de apartamentos que não terminou de ser construído, eles brincam uns com os outros. A mãe criticou Zabi por fumar sem parar, ele deu de ombros e saiu da sala para fumar outro cigarro.
Os dois tentaram manter as imitações de Karzai feitas por Zabi em segredo no bairro onde vivem. Ele raramente se apresenta na região e faz isso com bastante cuidado, ela, por sua vez, nunca contou às colegas que é mãe do famoso imitador.
No início da carreira de Zabi como imitador, ela se lembra que outros professores ouviram uma gravação que acreditavam ser de Karzai. Na verdade, era Zabi prometendo que os professores do Afeganistão ganhariam salários mais altos e terras para cultivar.
'Eu escrevi as leis no gelo, mas ele derreteu sob o sol', ele declarou.
Quando os colegas começaram a rir, a mãe de Zabi não disse uma palavra.
'Eles sabiam que era uma piada, mas havia tanta verdade no que ele dizia. O presidente sempre promete coisas que não cumpre'. Apesar de todas as críticas e xingamentos, Zabi reverencia o líder afegão, o único presidente eleito democraticamente em um país com histórico turbulento. Ele admira a tolerância de Karzai e sua compaixão em relação aos afegãos.
'Karzai é muito inteligente', afirmou, fumando um cigarro feito na China. 'Ele sabe manipular os problemas e as pessoas e faz promessas que não pode cumprir'.
Parando para mais um trago, Zabi piscou. 'Acho que ele é exatamente como eu', afirmou. 'É claro que nunca o encontrei. Mas ambos temos personalidades mercuriais'.
Zabi teme que o sucessor de Karzai não tenha o mesmo apreço pela liberdade de expressão, ou a mesma capacidade de lidar com críticas. Além, é claro, das questões práticas.
'Estou só esperando para ver quem irá ganhar a próxima eleição', afirmou, batendo as mãos nas pernas.
FONTE: MSN
Daniel Berehulak/The New York Times
'Ele faz parte da minha vida', afirmou Zabi, que adotou o jeito de andar do presidente, um andar propositalmente inclinado e afetado, com os ombros levemente elevados. Embora os dois não se pareçam nem um pouco, Zabi aprendeu a dominar os gestos e expressões faciais que são a marca registrada de Karzai.
'É claro que vou sentir falta dele', afirmou Zabi sobre o presidente. 'Sim, ele nunca me convidou para conhecê-lo, mas isso não tem importância. Ele nunca tentou machucar as pessoas'.
Depois de uma década no centro da vida pública afegã, Karzia está chegando perto do fim de seu mandato presidencial. À medida que esse dia se aproxima e as relações entre Karzai e os aliados americanos azedaram a ponto de gerar uma crise nos últimos meses, Zabi começa a se preocupar com o próprio futuro.
'No ano que vem, ninguém mais vai querer saber de imitações de Karzai', afirmou, saindo do personagem durante um raro momento de seriedade.
Embora Zabi seja popular neste momento, sua vida foi marcada por tragédias. Ele sempre foi pobre e ficou aterrorizado quando perdeu o emprego no Escritório de Relações Administrativas, ligado ao palácio presidencial. Seus superiores temiam que as imitações de Karzai pudessem causar problemas para todos no escritório, um medo que se espalhou por todos os setores e praticamente impediu que Zabi voltasse a ser contratado.
Nos últimos cinco anos, ele tentou arranjar diversos empregos, mas assim que os patrões potenciais ficavam sabendo quem ele era, temiam a atenção que ele pudesse atrair das autoridades. Ele foi obrigado a contar justamente com a imitação de Karzai que o havia deixado nessa situação.
É fácil imaginar Zabi se apresentando na TV em um país mas ocidentalizado, onde a imitação dos presidentes é vista como uma forma de arte. Porém, muito embora a sociedade afegã tolere a liberdade de expressão mais do que em muitos outros países muçulmanos, xingar as pessoas em público vai muito além dos limites do aceitável por aqui.
Zabi, que sofreu uma pequena lesão cerebral causada pela meningite quando era criança, tem dificuldades para controlar suas imitações e seu comportamento. Ele abandonou a escola no sexto ano em função das dificuldades de aprendizagem. Ele parece ter um espírito gentil e sensível, mas muitas vezes tem dificuldades para perceber que passou dos limites e, em frente das multidões, ele é instigado pelos fãs, que encorajam sua irreverência.
'Quando digo que não quero falar palavrões, eles não me dão dinheiro', afirmou, sentado em uma almofada na casa da família.
Um de seus amigos, dono de um hotel em Cabul, afirmou que Zabi pode encontrar um emprego mais permanente como imitador, se não falar tantos palavrões. Todavia, quando informado disso, Zabi simplesmente dá de ombros e diz que é livre para se expressar.
'Queremos que as pessoas se esqueçam de seus problemas. Quando ele vem e se apresenta, ele faz todo mundo rir e gostamos disso', afirmou Zabiullah Sharifi, o dono do hotel. 'Mas ele fala muitos palavrões e isso chega a incomodar as pessoas'.
Ele se tornou uma fonte constante de preocupação para a mãe, que conta com Zabi, seu filho mais velho. Ela sente medo quando ele está na rua, perguntando-se se ele foi preso ou espancado por pessoas que não gostam de suas imitações. Ele costuma caminhar sem rumo pela cidade, parando de tempos em tempos para ver amigos que pagam um dólar ou dois para ver suas apresentações.
De vez em quando ela liga para os amigos e pergunta se ele está incomodando, mas sua verdadeira intenção é saber se está tudo bem com o filho.
'Às vezes, quando ele chega tarde em casa, eu mando o irmão procurá-lo ou vou atrás dele sozinha. Ficamos muito preocupados com ele, sem saber aonde ele vai e com quem ele está, porque temos medo que alguém o machuque', afirmou a mãe, que é professora.
Sentados na casa da família, em um prédio de apartamentos que não terminou de ser construído, eles brincam uns com os outros. A mãe criticou Zabi por fumar sem parar, ele deu de ombros e saiu da sala para fumar outro cigarro.
Os dois tentaram manter as imitações de Karzai feitas por Zabi em segredo no bairro onde vivem. Ele raramente se apresenta na região e faz isso com bastante cuidado, ela, por sua vez, nunca contou às colegas que é mãe do famoso imitador.
No início da carreira de Zabi como imitador, ela se lembra que outros professores ouviram uma gravação que acreditavam ser de Karzai. Na verdade, era Zabi prometendo que os professores do Afeganistão ganhariam salários mais altos e terras para cultivar.
'Eu escrevi as leis no gelo, mas ele derreteu sob o sol', ele declarou.
Quando os colegas começaram a rir, a mãe de Zabi não disse uma palavra.
'Eles sabiam que era uma piada, mas havia tanta verdade no que ele dizia. O presidente sempre promete coisas que não cumpre'. Apesar de todas as críticas e xingamentos, Zabi reverencia o líder afegão, o único presidente eleito democraticamente em um país com histórico turbulento. Ele admira a tolerância de Karzai e sua compaixão em relação aos afegãos.
'Karzai é muito inteligente', afirmou, fumando um cigarro feito na China. 'Ele sabe manipular os problemas e as pessoas e faz promessas que não pode cumprir'.
Parando para mais um trago, Zabi piscou. 'Acho que ele é exatamente como eu', afirmou. 'É claro que nunca o encontrei. Mas ambos temos personalidades mercuriais'.
Zabi teme que o sucessor de Karzai não tenha o mesmo apreço pela liberdade de expressão, ou a mesma capacidade de lidar com críticas. Além, é claro, das questões práticas.
'Estou só esperando para ver quem irá ganhar a próxima eleição', afirmou, batendo as mãos nas pernas.
FONTE: MSN