sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Política


Países da América Latina são pouco críticos uns com os outros, diz especialista da UE

Conferência discute democracias turbulentas na Europa, América Latina e EUA





SÃO PAULO - Os países da América Latina têm uma tradição de serem pouco críticos uns com os outros. Esta é a conclusão de Christian Leffler, secretário-geral adjunto para Assuntos Econômicos e Globais do Serviço Europeu de Ação Exterior, vinculado à União Europeia. Especialistas de várias partes do mundo se reuniram nesta quarta-feira no seminário “Democracias turbulentas e o sistema internacional: perspectivas da Europa, América Latina e Estados Unidos”, promovido pela Fundação Fernando Henrique Cardoso e pelo The German Marshall Fund of the United States (GMF).
— Há uma falta de expressão clara, de críticas. Se você comparar com a experiência europeia eles são muito mais críticos uns com os outros e interferem se julgarem necessário — lembrou Leffler.
Os especialistas falaram especificamente sobre a questão da Venezuela, que com a mudança de governo no Brasil, tem enfrentado resistência e foi suspensa no Mercosul.
— A suspensão da Venezuela vai levar o Mercosul a fazer uma nova avaliação, o que vai ser muito positivo, porque agora temos Brasil e Argentina pensando da mesma maneira. Acho que podemos começar a rever essa relação e modernizar o bloco — disse José Botafogo, que foi embaixador do Brasil na Argentina.
No painel sobre América Latina, Botafogo falou ainda sobre a situação do Brasil com o impeachment da presidente Dilma Rousseff e a Operação Lava-Jato, e citou uma mudança de comportamento dos brasileiros.
— A corrupção e a irresponsabilidade fiscal sempre existiram e sempre foram praticadas. A diferença é que, de uns anos para cá, a corrupção foi um instrumento usado pelo governo para se manter no poder. Depois do Mensalão e da Lava-Jato será difícil imaginar que daqui em diante continuarão a fazer isso, porque a sociedade não aceitará mais. A irresponsabilidade fiscal também é um fenômeno antigo, mas a diferença é a intensidade com que se fez isso.
Christian Leffler também lembrou que os países latino-americanos, especialmente o Brasil, são democracias jovens, mas participativas, o que, para ele, é um sinal de saúde da sociedade.


ESTADOS UNIDOS
Quando o assunto são as eleições americanas em outubro, os especialistas não conseguem chegar a um consenso sobre quem deve ganhar: Hillary Clinton ou Donald Trump.
— O resultado é imprevisível. Pensamos nos Estados Unidos como um país rico, mas 50% da população é de classe média, com um nível de educação não tão alto. Não sabemos como essa massa vai para as urnas, ainda mais depois dessa falta de transparência — ressaltou o embaixador Rubens Barbosa, referindo-se ao mistério envolvendo o estado de saúde da candidata democrata.
Eles concordaram, no entanto, que, independentemente de quem vença, as relações do país com a América Latina não devem sofrer mudanças significativas. E destacaram a imigração como o maior problema a ser enfrentado pelo novo presidente dos Estados Unidos.
— Há claras visões diferentes sobre imigração. Donald Trump pode deportar as pessoas que estão ilegais nos Estados Unidos. Já a Hillary Clinton tem uma visão bastante diferente sobre o tema. Mas a América Latina continuará sendo um assunto de menor importância na pauta de Washington — destacou Barbosa.
Para Kori Schake, pesquisadora do Instituto Hoover, as eleições em novembro também põe em jogo o futuro do partido Republicano e uma possível ascensão de um terceiro partido.
— O futuro do partido Republicano pode ser menos claro e menos positivo se Trump vencer a eleição. Ele devastaria o partido e, com isso, acredito na ascensão de uma terceira legenda. Mesmo se ele perder por uma diferença pequena, vai validar essas políticas que ele reproduz na campanha e que nem vale a pena repetir, e isso pode ser um desafio para os conservadores.


EUROPA
Christian Leffler destacou a má distribuição dos benefícios conquistados na União Europeia, assim como os problemas dos choques externos como a anexação da Crimeia pela Rússia e a imigração.
— Pessoalmente acho que a grande história do ano passado não foi a caótica imigração irregular na Europa, mas como ela foi gerenciada — explicou ele, dizendo que os imigrantes não se dispersaram por todo o continente.
Jorge Castañeda, ex-chanceler mexicano, destacou que a Europa errou ao não criar mecanismos melhores para proteger as pessoas desempregadas.


Talvez você não veria o Brexit acontecendo. A maioria dos governos acreditava no estado de bem estar social e não construiu esses mecanismos, deixaram que cada indivíduo o fizesse.
Michael Leigh, conselheiro da GMF, destacou, no entanto, que não acredita na possibilidade da União Europeia desintegrar e desaparecer e na saída de mais países do bloco.
— Não acho que isso vai acontecer, mas acho que o bloco vai sobreviver de uma forma diferente. Vamos ver a continuação mas vai se tornar mais intra-governamental. Acho que os argumentos da União Europeia que os benefícios de permanecer são tão fortes que outros países não vão sair.

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