quarta-feira, 17 de outubro de 2018

Venezuelanos deixam Roraima de ônibus e voltam ao país vizinho

MUNDO
Regime Maduro diz que 6.389 retornaram do Brasil; governo estadual nega apoio à repatriação


Dez pessoas estão deitadas em macas, com lençóis coloridos. Duas acompanhantes observam os pacientes.Pacientes esperam atendimento em um hospital público de Boa Vista, em Roraima; maior parte dos atendidos na rede local é de venezuelanos - Nacho Doce - 22.ago.18/Reuters

Venezuelanos têm deixado Roraima e voltado a seu país de origem de ônibus, que têm sido contratados em Boa Vista, capital do estado, para transportar venezuelanos até a fronteiriça Pacaraima. Após cruzar a fronteira, já em Santa Elena de Uairén, os venezuelanos são levados em outros ônibus para as regiões de origem. O governo de Roraima, estado fronteiriço e porta de entrada dos migrantes, considera o número pequeno perto do total de estrangeiros que estão no estado, que diz abrigar ao menos 40 mil venezuelanos.Essa repatriação a conta-gotas não tem participação do governo local, segundo a governadora Suely Campos (PP). Sua gestão alega que em nenhum momento foi procurada pela Venezuela para contribuir com o retorno dos migrantes ao país de origem. Em setembro, porém, a governadora havia anunciado que o estado pagaria ônibus fretados até a fronteira para venezuelanos que desejassem voltar a seu país pelo programa de repatriação do ditador Nicolás Maduro.

 E é exatamente o que está ocorrendo, com ou sem auxílio brasileiro.O regime de Maduro afirma ter repatriado nos últimos dois meses 7.907 venezuelanos que tinham migrado para outros países, dos quais 6.389 estavam no Brasil.De acordo o Ministério das Relações Exteriores, esses venezuelanos deixaram o seu país por fatores associados às expectativas de vida, razões de natureza econômica e devido ao que considera uma campanha de mídia e política de promoção da saída da população da Venezuela.Além dos que estavam no Brasil, o governo do país vizinho diz ter levado de volta 564 que viviam no Peru, 465 no Equador e outros 489 espalhados por Colômbia, Argentina, República Dominicana, Chile e Panamá.O programa é uma tentativa do governo Maduro de mostrar força, na avaliação de migrantes que vivem no Brasil, mas o êxodo só terminará com o fim da ditadura, dizem oposicionistas como o ex-prefeito David Smolansky.

Segundo o governo, entre os motivos alegados por quem quis voltar estão a xenofobia no país de destino, abuso de trabalho, desemprego, problemas de saúde e dificuldades econômicas.A Folha tentou contato telefônico com a cônsul venezuelana em Boa Vista, Gabriela Ducharne Cardenas, para falar sobre a logística da repatriação, mas ela desligou quando a reportagem se identificou.
Ela acompanhou Suely em setembro numa reunião com Maduro em Caracas, na qual o estado se comprometeu em apoiar o consulado na execução do Volta à Pátria.Conforme os dados do ministério, fornecidos pela embaixada venezuelana, 77% dos repatriados voltaram ao país via terrestre, a partir do Brasil e da Colômbia. Nos outros casos, os venezuelanos foram transportados em 13 voos.Nas ruas de Boa Vista, os estrangeiros ouvidos pela Folha alegam não ter interesse em retornar à Venezuela devido à falta de condições econômicas e sociais no país."Só quero um emprego. Com um emprego, o Brasil não precisará se preocupar com a gente. Trabalhando, eu sustento minha família", disse o venezuelano Jean Rosales, que chegou à capital em setembro e, desde então, dorme em papelões em frente à rodoviária de Boa Vista.De acordo com Juan Garcia, que está na cidade desde o dia 1º, não há possibilidade de retorno espontâneo à Venezuela enquanto Maduro estiver no poder.
"Não há condições, nem morais nem de governo, para ele prosseguir. Ninguém veio para o Brasil ou foi para outros países por desejo puro. Ninguém sai de seu país se houver condições mínimas nele. No nosso, não há."Com o alto número de venezuelanos morando em Roraima, problemas sociais têm se avolumado no estado. De acordo com o governo estadual, há 111 venezuelanos presos no sistema penitenciário local. Os crimes mais comuns são roubo (44 presos), tráfico de drogas (24), furto (12) e homicídios (11).Desde 2015, foram registradas 4.282 ocorrências policiais envolvendo estrangeiros. Só no primeiro semestre, os casos ligados a venezuelanos representaram 5,29% do total.A situação é considerada mais crítica em Pacaraima, onde 6 de cada 10 ocorrências têm elo com venezuelanos.Na mesma cidade, o hospital Délio Tupinambá fez 10.368 atendimentos no primeiro semestre, dos quais 6.509 de migrantes do país vizinho.

FOLHA DE S. PAULO

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