quinta-feira, 9 de junho de 2022

Quanto comer carne custa ao mundo e como a agricultura 4.0 pretende reduzir esse dano

AGRICULTURA
FOTO: REPRODUÇÃO


A produção de carne é uma das atividades mais intensas e que mais demandam recursos na economia global. Dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura estimam que quase 30% de toda área mundial é utilizada para a produção de gado, pastagens e ração. Em comparação, a área utilizada por outros plantios é de 7%, enquanto a ocupada por centros urbanos, cidades e outras formas de infraestrutura é de apenas 1%.

Esse número já demonstra o desafio que é alimentar o planeta com proteína animal, seja carne de vaca, frango, peixe, carneiro e ovos. Nos últimos anos, no entanto, com a ascensão da classe média em países da África e da Ásia, especialmente a China, aumentou ainda mais a demanda do setor agropecuário mundial, que se vê com um número de consumidores que aumenta mais e mais com o passar dos dias.

Por outro lado, ambientalistas, políticos e membros da sociedade civil pedem pela redução imediata de impactos no meio ambiente. Só no Brasil, um dos maiores produtores de carne do mundo, temos visto um aumento cada vez maior das taxas de desmatamento das matas nativas. Em 2021, segundo dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, foram perdidos o equivalente a 13 mil km² de mata virgem, o equivalente a 216 campos de futebol por hora.

De acordo com Marc Dourojeanni, ao contrário do que se pensa, a maior parte desse desmatamento não é feito por grandes conglomerados alimentícios, mas sim por pequenos agentes que agem a partir da informalidade. De acordo com o pesquisador, um estudo recente demonstrou que 75% do desmatamento anual no Peru é realizado em propriedades pequenas, com menos de meio hectare.

Ou seja, não é uma atividade que explicite envolvimento de grandes empresas, ainda mais quando se contabiliza o fato de que esses biomas, Amazônico no caso do Peru e do Brasil, ou Cerrado no caso somente do Brasil, possuem um solo pobre, intemperizados e que não aguentam o desmatamento para servir de pastagem.

Custos da produção animal

Apesar de grandes empresas não estarem diretamente conectadas a danos ambientais criminosos, a produção agropecuária ainda é uma atividade danosa ao meio ambiente. Dados apontam que não só o setor é responsável por 14,5% da emissão de gases de efeito estufa, mas a utilização de agrotóxicos e antibióticos causam também grandes danos à saúde humana, seja à exposição direta ou indiretamente pelo consumo.

A criação de gado também utiliza cerca de 23% de toda água disponível para consumo no planeta e 30% da energia gerada mundialmente. Todo esse gasto, no entanto, representa apenas 15% das calorias do prato do brasileiro, e 13% do prato do americano.

Como forma de aliviar todos esses impactos à natureza, grandes empresas vem se utilizando cada vez mais de desenvolvimentos tecnológicos em suas linhas de produção, desde o produtor até o consumidor final.

Agricultura 4.0

Não é de se surpreender que as mesmas tecnologias que permitem facilidades digitais em nossas vidas, seja através do acompanhamento de nossa saúde em um smartwatch ou ao pedir um carro por aplicativo, também deem a fazendeiros e pecuaristas maiores recursos e benefícios na hora de manejar suas plantações e gados.

Chamada de Agricultura 4.0, essa revolução tecnológica permite aos agropecuaristas uma maior agilidade e autonomia para resolver problemas, maior conectividade com sistemas e ferramentas digitais, como chips e drones, e melhor controle quanto aos processos produtivos. O resultado disso é uma redução do desperdício de insumos e a possibilidade de criar ações voltadas à sustentabilidade de suas empreitadas.

Esse conjunto de técnicas difere de inovações passadas. Pode-se dizer que a Agricultura 1.0 é aquela feita à mão, sem dispor de muitos recursos tecnológicos e geralmente voltada à subsistência.

Já a 2.0 se deu com o final do feudalismo na Europa e a reorganização da estrutura dos campos. Isto é, com a perda dos campos comuns e o cercamento das terras. A agricultura 3.0, por sua vez, se deu com a chegada da revolução verde e com a introdução de insumos industrializados e do maquinário agrícola. Ela ficou marcada tanto por processos como automação e o início da coleta de dados, com a agricultura de precisão, quanto por sistemas de irrigação e maquinários como tratores e colhedoras.

"De certa forma, a segunda e a terceira revoluções continuam em andamento com maior ou menor intensidade em diferentes partes do globo" afirma Davi Bungenstab, especialista em sustentabilidade da Embrapa Gado de Corte.

Agora, com a agricultura 4.0, esses processos iniciados da agricultura 3.0 ficaram ainda mais disponíveis para os agropecuaristas. Se antes era preciso um investimento alto para poder contar tanto com a ajuda de agrônomos, quanto com a tecnologia de precisão, agora com um smartphone na palma da mão tem-se acesso a quase todos os mesmos processos e ainda outros, como ferramentas de gestão, drones e computação em nuvem. Outro marco dessa nova etapa é a chegada da inteligência artificial e do aprendizado de máquina para o mundo agrícola.

"A agricultura 4.0 base-se essencialmente em três pilares: uso de sensores com forte ênfase em IoT (Internet das Coisas),inteligência ar%'cial (IA) e “big data” que é a exploração de grandes bases de dados", disse Bugenstab.

Ela permitirá que os produtores possam reduzir ainda mais os custos de produção, aproveitando os insumos e evitando desperdícios, elevem a produtividade do solo graças à coleta de dados e possam agir rapidamente a problemas, como pragas ou falta de nutrição no solo graças a conectividade entre um celular e um maquinário.

Drones, chips e satélites

É justamente através dessas novas tecnologias trazidas pela agricultura 4.0 que grandes empresas e instituições de pesquisa estão buscando métodos para reduzir os impactos ambientais da produção agropecuária. A ideia é desde o repasse desses avanços tecnológicos ao produtor, até a implementação de melhorias no produto final para o consumidor.

A Cargill, líder mundial no setor, traz iniciativas digitais tanto para suas linhas de produção de grãos quanto de gado. Uma das mais interessantes é o Cargill CattleView, que se encontra em fase de testes em três fazendas brasileiras nesse momento, com cerca voos diários em 220 currais diferentes.

O CattleView utiliza drones, computação em nuvem, visão computacional e inteligência artificial para fornecer uma série de informações ao pecuarista que o ajudam a tomar decisões que visam o melhor manejo e bem-estar do gado.

"Essa tecnologia apresenta caráter disruptivo para o setor, uma vez que o método atualmente utilizado para monitorar e tomada de decisão é realizado de forma subjetiva e depende da experiência do tratador e sua disciplina em visitar toda a extensão dos currais regularmente, deixando uma margem muito grande para erros e consequente ineficiência", afirmou a empresa.

A Marfrig é outra empresa que aposta no repasse de tecnologia ao produtor para melhorar a qualidade e reduzir impactos da produção. Através da plataforma de rastreabilidade Conecta, que realiza o monitoramento via satélite dos produtores em Mato Grosso e em Rondônia, a empresa consegue cruzar informações sobre os produtores e dados públicos para verificar a presença de desmatamento em suas linhas de produção.

Um dos grandes diferenciais da tecnologia é que ela é descentralizada, sendo baseada em blockchain, podendo ser utilizada também pelos produtores de carne da Marfrig para verificarem seus fornecedores de insumos e ver se estão de acordo com as práticas de combate a irregularidades da empresa.

A Embrapa, uma das maiores desenvolvedoras de tecnologia para o setor agropecuário brasileiro, também tem iniciativas nesse setor. O AgroTag, por exemplo, desenvolvido pela Embrapa Meio Ambiente e pelo Instituto Eldorado, é um ecossistema digital colaborativo onde empresas, instituições e sociedade podem realizar o acesso e troca de dados geoespaciais.

"Temos exemplos práticos da utilização do AgroTag no campo em locais remotos, envolvendo, por exemplo, demandas do Governo do Pará no interior daquele estado, o AgroTag Pará, bem como na Amazônia Legal, AgroTag Manejo Florestal e Extrativismo (MFE)", afirmou Luiz Vicente, pesquisador do Embrapa Meio Ambiente.

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