segunda-feira, 28 de agosto de 2017

TECNOLOGIA

Mulheres da TI contam histórias 

de machismo e como vêm 

conquistando seu espaço



Isabella pesquisa sobre Javascript, algoritmos de aprendizagem e novas tecnologias, além de trabalhar em uma agência | Foto: Giovana Fleck/Sul21

Isabella Silveira de Souza conta que se preparou bastante para o primeiro evento de tecnologia da informação em que participaria como palestrante. Trabalhando na área de TI desde 2010, ela só falou diante de um público há dois anos. Com um currículo de alguém que ajudou a desenvolver o sistema de gestão acadêmica da UFRJ, atendeu clientes como o Banco Votorantin, a Universidade de Stanford e o Grupo Estadão, além de ser pesquisadora de Javascript e algoritmos de aprendizagem, Isabella subiu ao palco com bagagem de veterana, apesar de ter menos de 20 anos. Os comentários nas redes sociais, no entanto, foram sobre tudo, menos seu currículo. “Ah, legal a palestra, mas com a palestrante gatinha assim, dá para prestar atenção em qualquer coisa”, escreveu um usuário do Twitter.

“Nenhum tinha a ver com o que eu estava apresentando. Você fica frustrada na hora, mas ao mesmo tempo dá aquela raiva que faz insistir e continuar pra ver se algo muda. Ninguém chega na palestra de um cara e diz: ‘nossa, como você é musculoso’. É sempre: ‘nossa, como você é inteligente, que conteúdo foda’”, diz. Aos 22 anos, ela foi uma das palestrantes escaladas para falar na versão brasileira do maior evento de Javascript do mundo, o Brasil JS, que aconteceu este fim de semana em Porto Alegre. 

A história de Isabella é apenas mais uma, longe da exceção, do quanto o meio da TI ainda é muito masculino e machista. Segundo a Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (Pnad), realizada pelo IBGE no ano passado, no Brasil, apenas 20% dos 580 mil profissionais atuando na área são mulheres. Nos Estados Unidos, o número chega a 25%. Enquanto no Facebook, as mulheres ocupam 31% dos postos de trabalho, no Google, Apple e Twitter, gira em torno de 30%. Quando se pensa em mulheres em cargos de chefia nas gigantes da TI, raros casos, como Sheryl Sandberg, chefe executiva de tecnologia do Facebook, vêm à mente.
O que acaba afetando meninas que nem pensam em entrar na área, por acreditarem que não é seu lugar. Isabella conta que ela mesma caiu de paraquedas em um curso técnico de informática, quando começou a estudar em uma escola federal e precisou preencher uma opção de ensino técnico. “Se eu tivesse que escolher conscientemente uma área, não teria escolhido essa. Se eu não vejo alguém como eu, sendo bem sucedida em alguma coisa, o que me faz achar que eu vou conseguir?”, explica. 

No curso de Ciências da Computação, na UFRJ, para onde seguiu depois da escola, de cada 50 alunos, três eram meninas, segundo ela. O ambiente acadêmico também não era nada acolhedor. Ouvir professores dizendo que o “o semestre seria difícil”, depois de encontrarem meninas na sala, era algo recorrente. Nos laboratórios, na frente das alunas, muitas vezes eles pediam que chamassem “fulano” para resolver algo, sem dar chance à elas. Os casos de assédio sexual também eram comuns. Isabella mesmo conta que ouviu comentários sobre sua aparência e decote da blusa, vindos de docentes, algumas vezes.

Isso pesou na decisão de largar o curso antes da conclusão. Assim como acontece com 79% das mulheres que começam cursos de TI no Brasil, segundo o Pnad 2016. “Você não se sente muito bem-vinda e/ou respeitada lá dentro. No trabalho, eu também passei por isso, você tem que se provar muito mais, tem que fazer a mesma coisa cinco vezes, para mostrar que você sabe fazer. Para confiarem, pra colocarem uma responsabilidade na sua mão. Você sabe que não é bem-vinda ali”, conta ela. 


Fonte: Sul 21

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