Tombamento Ameaçado
Ambicioso, Agnelo quer vender Paranoá, ar e o Céu de Brasília
Foi essa conclusão que chegou a filha do ex-governador Joaquim Roriz, em discurso emocionado que mereceu aplausos de uma platéia que ficou de pé
O PPCUB tem pontos muito preocupantes. Entre eles, a criação de lotes de até 20 mil metros quadrados na área que compreende entre a igreja Nossa Senhora da Paz e a rodoferroviária. Entre as destinações destes terrenos, o comércio não foi esquecido. |
Agnelo Queiroz virou saco de pancadas na Câmara Legislativa. Foi nesta quinta-feira 17. O governador foi chutado pela deputada distrital Liliane Roriz (PRTB) como se chuta um cachorro morto. Não foi um discurso verborrágico. Foram palavras de bom senso para atacar projetos utópicos. ...
Agnelo está vendendo Brasília. Alguém está ganhando por fora. Foi essa a conclusão que chegou a filha do ex-governador Joaquim Roriz, em discurso emocionado que mereceu aplausos de uma platéia que ficou de pé.
Embora sem ter cadeira na Comissão de Assuntos Fundiários, Liliane fez questão de acompanhar a sessão que discutia um projeto de mudanças no plano urbanístico de Brasília. O que o Palácio do Buriti propõe é uma aberração. A capital, se o projeto for aprovado, ficará desfigurada. São palavras dela.
Enquanto a trupe petista se preparava para aprovar uma proposta vista como aberração, Liliane usou a palavra. Lembrou que não é especialista em urbanismo ou mesmo em arquitetura. Mas afirmou sua condição de parlamentar eleita, praticamente nascida em Brasília e que tem por maior prerrogativa não o desempenho de papel de fiscal, mas estar defendendo os interesses do povo da cidade que diz amar.
A deputada lembrou que desde que foi sonhada por JK, Brasília já nasceu para ser diferente. Não deveria possuir aquele aglomerado urbano, típico das caóticas megalópoles ou mesmo a poluição visual acima de qualquer coisa. “Isso porque, como todos sabem, o céu de Brasília, um de nossos cartões de visita, deveria e deve manter-se como moldura para qualquer paisagem que tenhamos de nossa cidade”, enfatizou.
As mudanças sugeridas por Agnelo, avalia Liliane, são “ uma completa aberração do ponto de vista de quem realmente tem compromisso com esta capital”. Ela lembrou que antes o governo apenas ameaçava e levantava uma bandeira ainda discreta sobre a possível mudança do projeto original de Lúcio Costa.
- Quem não se lembra da polêmica construção da 901 Norte, que critiquei de forma determinada nesta Casa?, questionou. “ Fui contrária até o fim, lutando contra o inchaço que tomaria conta do início da Asa Norte. E o Buriti sem forças para lutar contra a opinião pública, que juntou-se a nós nesta luta, resolveu recuar. Parecia até ter engavetado essa proposta esdrúxula e calou-se com o tempo”.
Mera ilusão, reconhece Liliane, distribuindo olhares à plateia atônita. E acrescenta: “Eis que agora, sem mais nem menos, surge novamente. E desta vez pior: as propostas agora muito mais polêmicas, que mudam, por exemplo, a destinação de áreas, alteram gabaritos de prédios e até mesmo criam áreas comerciais em locais onde a natureza e o horizonte são mais do que suficientes.”
A deputada fez uma autocrítica. “Tenho para mim que muitos que ainda não me conhecem começam a construir um pensamento na cabeça do tipo: ‘quem essa moça pensa que é? Não é a filha de Joaquim Roriz, aquele governante que inchou o Distrito Federal? ‘”. Ela mesma responde: “Quero deixar claro que esse pensamento é pequeno, superficial e vazio, fruto de uma campanha difamatória criada por opositores da época, que até então criticavam a política habitacional de meu pai, o ex-governador Joaquim Roriz, e que hoje trabalham contra tudo o que sempre recriminaram.”
No entendimento de Liliane Roriz, o governo promove uma verdadeira farra em Brasília.
- Na época do Roriz, as quase 100 favelas que começavam a dominar o Plano Piloto foram removidas para os então assentamentos, hoje cidades estruturadas. As famílias ganharam um endereço, um CEP. Isso foi uma política habitacional que não apenas reconhecida hoje por quem nunca teve um lar, um endereço, mas foi premiada também pelas Nações Unidas como modelo de assentamento urbano.
Entretanto, ainda segundo a deputada, quem sempre criticou o ex-governador, “cala-se quando alguém pede para citar um único ato praticado por Roriz que tenha ameaçado o tombamento de Brasília. Isso Não há.”
Liliane falou sem apartes. Notava-se que defendia o povo, o oprimido, o sem teto, o sem futuro. Fez um contraponto com o ontem e o hoje: “percebemos que o governo de hoje trabalha para, em vez de preocupar-se com o povo, com quem realmente necessita, foca seu trabalho e suas ações para beneficiar os empreiteiros e empresários que enxergam nossa cidade apenas como uma mina de ouro, e não com olhar de quem realmente mora e vive aqui.”
Ela advertiu para o caos que está a caminho. Ilustrou os desmandos citando o Setor Hoteleiro, que possui hotéis de baixo gabarito, aqueles com até três andares, mas que ganharam de presente no texto enviado pelo Executivo a autorização de fazer com que esses pequenos prédios possuam tantos andares como os maiores, proporcionando uma valorização comercial de milhões de reais. Quem sai ganhando com isso? O povo ou os donos dos atuais terrenos onde os hotéis estão construídos?
Outro ponto enfatizado por Liliane: o governo também pretende fazer a mesma benfeitora com os prédios do Setor Hospitalar Sul. Construções solidificadas, que já possuem clientela, terão a chance de pelo menos dobrar o tamanho, também valorizando os imóveis. E mais uma indagação: "Quem vai ganhar com isso? O cidadão que usa um hospital público, que sequer é lembrado pelo atual governo, ou os donos de prédios e hospitais particulares que já estão cheios de dinheiro?".
Os danos propostos pelo Buriti se alastram para outros pontos de Brasília. Como a Avenida W3 Sul, que ao contrário de ser revitalizada, como se esperava, cederá as áreas remanescentes de estacionamentos para novas edificações.
- Mais uma vez me pergunto: onde está o benefício do povo para isso? Já os empresários, os empreiteiros principalmente, mais uma vez estão com a bola toda.
Os problemas, porém, não param por aí. Os terrenos beira lago localizados no Setor de Clubes serão vendidos para a construção de verdadeiros complexos hoteleiros, privatizando a orla do Paranoá e afastando esse patrimônio cada vez mais da população. É uma medida que contraria a própria Justiça, que acaba de determinar a desocupação de áreas que beiram o lago, principalmente na região do Lago Sul.
- Não bastasse o fato de o Executivo desrespeitar o Judiciário, vem agora o Buriti e tenta enfiar goela abaixo da Câmara Legislativa uma proposta de lotear o Lago Paranoá com hotéis de selos internacionais.
A extravagância de Agnelo, típica de quem passa por problemas psíquicos, vai mais além. Se o novo modelo urbanístico for aprovado pelos deputados distritais, o trecho do Eixo Monumental que liga a Igreja Nossa Senhora da Paz à Rodoferroviária será destinado a uma área comercial. O avião traçado pelos criadores da cidade vai explodir, claro.
- O governador precisa parar de brincar e governar de verdade, sentenciou Liliane. E lamentou que tudo isso aconteça porque Agnelo tem vergonha de sair às ruas porque não consegue enfrentar o povo cara a cara. Ele (o governador) é cobrado o tempo todo não apenas pelos compromissos assumidos na última campanha, mas principalmente pela falta de coerência.
A deputada bateu mais. Levantou uma suspeição grave. “Fora os empreiteiros, os empresários, que obviamente estão interessadíssimos nesta matéria que tramita na Câmara Legislativa, a sensação que temos é que há mais pessoas ganhando com este projeto. Não é possível que um ser humano, por menor que seja seu comprometimento com a cidade, não perceba que este projeto é completamente equivocado e contrário ao que espera o povo do Distrito Federal de seus governantes.”
- Nossa gente quer hospital, e não encher o bolso dos já milionários. Nossa gente quer segurança, e não uma rede de hotéis internacionais na beira do nosso lago. Nossa gente quer transporte público de qualidade e não mais um blábláblá de que a aprovação desse projeto vai tirar o gesso da Capital e transformar Brasília numa metrópole de verdade, atacou a deputada.
O momento, segundo Liliane, é de acabar com a inversão de valores. “O povo elegeu um governo do Partido dos Trabalhadores porque imaginava que os trabalhadores estariam em primeiro lugar, não os patrões e empregadores.”, lamentou.
Poucas vezes se ouviu um pronunciamento tão eloquente na Câmara Legislativa. A deputada usou o tom de quem está pronta para entrar na batalha que indicará o próximo ocupante do Palácio do Buriti. Foi emotiva, mas firme. Foi dura com o governo e branda com o povo. E pode ser a algoz de Agnelo em 2014.
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